A terra está de luto! Coragem!






Por todos os lados acontecimentos que nos atingem profundamente, retirando de nosso rosto a alegria causam o medo, a angústia e o desespero. No mesmo dia, professores massacrados pela Polícia Militarde São Paulo ao protestarem contra as perdas de direitos promovidas pela Gestão Dória, e a vereadora e militante de Direitos Humanos Marielle Franco, executada a tiros no Rio de Janeiro após ter denunciado o abuso policial contra a população das favelas cariocas.

O cenário de desolação não é diferente daquele experimentado por Isaías:

Eis: os de Ariel soltam gritos nas ruas,


os mensageiros de paz choram amargamente.

Os caminhos estão desertos,

não há mais viandantes nas estradas.

A aliança está rompida, as cidades, rejeitadas,

ninguém mais vale nada.

A terra está de luto, languesce. (Is 33,7-9)

Mulheres agredidas, jovens negros mortos por policiais e jogados em valas sem identificação, idosos abandonados, crianças refugiadas entregues à própria sorte, a população LGBT martirizada, discursos de ódio cada vez mais frequentes, desemprego, fome. Os senhores do poder vertendo mais e mais dinheiro para financiar guerras e seus privilégios ao redor do mundo, longe da dura realidade do povo. A Criação que “geme ainda agora nas dores do parto” (Rm 8,22).

Qual a atitude cristã diante disso tudo?
Diga ao povo que caminhe
Os hebreus, no livro do Êxodo, eram escravos no Egito, o maior império da época. Situação semelhante à vivida hoje pela maioria da população mundial: subjugada ao poder das elites, que utilizam a violência para reprimir quem ameace seu status. Com o povo apavorado e dizendo a Moisés que preferia a escravidão à morte certeira pelas tropas egípcias, Deus responde: “Por que clamas a mim? Fala aos filhos de Israel: que se ponham a caminho!” (Ex 14,15).

Deus não dá como certa vitória do povo hebreu. Ao contrário, sua atitude é a de um pai que, vendo o filho cair, ensina-o a ficar de pé novamente. E parece se indignar: “Do que vocês têm dúvida? Não sou capaz de cumprir com aquilo que prometi?”. Caminhemos, então, ainda que sem saber o que vem pela frente!

Da mesma forma, Deus encoraja o profeta Ezequiel: “A caminho! Vai junto aos deportados, junto aos filhos do teu povo; tu lhes falarás; quer escutem, quer não, tu lhes dirás: ‘Assim fala o Senhor Deus’” (Ez 3,11). Ele lembra que é necessário agir, colocar-se a caminho, e ordena ao profeta que não tema não ser aceito. Longe de ser insensível, é o próprio Deus que assume a autoria das palavras que ele dirá. A missão dos profetas, muitas vezes perseguidos, era a de denunciar o que desagradava a Deus. Também nós somos chamados a denunciar as injustiças, confiantes de que é o próprio Senhor que fala na nossa voz. Colocar-se a caminho, agir, denunciar, confiar!

Coragem
Ao aceitarmos o chamado de Deus para sermos “sal da terra e luz do mundo” (Mt 5,13-14), assumindo a missão profética dada pelo batismo, não podemos cair na tentação de achar que as coisas serão fáceis, tranquilas. A vida real é onde atuaremos e é na História Humana, com todas as suas contradições, que somos chamados a continuar o processo criador de Deus, organizando o caos (Gn 2,19-20).

O Senhor, antes de cogitarmos sua incompreensão diante de nossas dores, ao contemplar os desdobramentos de sua criação, as guerras e destruições promovidas pelos seres humanos, decidiu se fazer humano também. Como predisse Isaías, “são os nossos sofrimentos que ele carregou, foram as nossas dores que ele suportou” (Is 53,4). Deus não só conhece nossas dúvidas e sofrimentos, como as experimentou.

E é justamente por conhecer o mais profundo da miséria humana, que Ele nos coloca de pé, a caminho: “Neste mundo vocês terão aflições, mas tenham coragem; eu venci o mundo.” (Jo 16,33). Coragem, portanto! A caminho e com coragem! Ainda que não tenhamos, em nossos corações, a certeza de que o mar vai se abrir para passarmos. Mesmo que não saibamos se seremos ou não ouvidos. A caminho! Coragem! É o Senhor quem nos fala e que fala por meio de nós!


Fonte: Texto de Guilherme Demarchi publicado por Centro de Estudos Bíblicos, 19/09/2018.

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